Na oficina Como escrever um livro, que oriento há muitos anos, houve uma discussão quando uma aluna disse: Comecei a ler o Senhor dos Anéis, um livro muito mal escrito. Um colega contra-argumentou: Eu gostei do livro. Se você não gostou, é um problema seu, isso não quer dizer que não seja um bom livro, só que não agrada a todos os leitores.
E
eu tive que desafiar o grupo com uma pergunta:
-
Será que existe um livro que agrada a todos os leitores?
Uma
senhora respondeu: - A Bíblia.
Um
rapaz retrucou: - Será que ateus gostam de ler a Bíblia? (Risos)
Alguém
disse: - Machado de Assis.
Apoiou
um senhor idoso: - Isso mesmo.
Um
aluno não esteve de acordo: - Minha tia não gosta de Machado de Assis, porque
uma professora obrigou-a a ler O Alienista no colegial, na época que havia
colegial...
-
E os Lusíadas de Camões?
Silêncio
na sala. Por fim, um rapaz disse: - Será que todos leram Os Lusíadas? Eu nunca
vi esse livro na lista dos mais vendidos. E será que todos aqueles que leram apreciaram
o livro? Ou alguns têm medo de falar que não gostaram e de parecer burros?
A
discussão continuou por algum tempo. Por fim, eles mesmos chegaram à conclusão
de que existe um livro aceito por todos os leitores. Existem livros aceitos pela
maioria dos leitores, os best-sellers. Existem livros aceitos pela maioria dos
intelectuais, em geral, livros que ganham prêmios importantes. Mas sonhar que
um livro será apreciado e aplaudido por todos os leitores é algo muito difícil
de acontecer. Talvez impossível em um país livre. Cada cabeça é um universo.
Tem suas nuances. Sua história pessoal. Seu olhar único.
É
tão fácil criticar o trabalho de outrem e tão difícil criar e realizar uma obra
de arte que o aforismo fala “a crítica é fácil, a arte, difícil”. É assim
mesmo, ver o erro no trabalho dos outros não leva muito tempo, por exemplo,
observar um quadro e criticar pode levar questão de minutos.
Ler
um texto e sentir desagrado também não leva muito tempo, em geral depende da
dimensão do texto a ser lido. E, às vezes, nem isso. O leitor começa o texto e
nem dá chances... já forma uma opinião ao focar as primeiras frases. E é muito
interessante que a maioria das pessoas não fala: eu gostei, ou eu não gostei do
texto, ela afirma: “está muito bem escrito”, “está mal escrito”, ou pior ainda,
“esse é um bom escritor”, “esse escritor é ruim”, como se umas poucas frases
fossem suficientes para julgar a obra completa de um autor.
“Eu
não gostei desse livro” é uma frase honesta. “Esse livro é ruim” é uma frase
fruto da arrogância, que tenta mostrar que a opinião dessa pessoa tem valor
universal. Parece que ela está gritando: “Ei! Não leiam esse livro! Eu não
gostei e ninguém deve gostar dele. Eu já falei, esse livro é ruim. Escutem meu
recado”.
É
comum em concursos literários haver pessoas insatisfeitas, aqueles que não
ganharam, logicamente. Algumas dessas pessoas, ao conhecer os poemas ganhadores,
enviam e-mails dizendo: “O poema que ganhou o primeiro lugar não é bom”. E não
adianta. O poema precisa ser bom para os jurados. Às vezes eu também não fico
contente com um trabalho que conquista o primeiro lugar, mas fico em silêncio
pensando que cada ser humano tem vivências e ideias diferentes e que é preciso
aprender a respeitar a escolha dos outros.
Gostei imensamente de te ler, livros são escolhas pessoais. Um abraço, Yayá.
ResponderExcluirObrigada querida poeta, é muito bom para qualquer autor saber que seus textos são lidos. Abraços.
Excluir